segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Filhos do Escuro

“Ele está vindo por mim.

Enquanto escrevo espero minha morte aqui, de frente para esta porta.

Mas não vou lamentar. Eu mereço isso. Sou uma criança maligna.

No fundo você sabe do que estou falando. O escuro. Aquela sensação que nós temos quando estamos em meio à escuridão. Aquela sensação que somos pequenos e indefesos diante do desconhecido. A maioria das crianças se enrola nas cobertas, algumas chamam os pais. Mas eu não sou assim. Eu enfrentei. Perdi o medo do escuro. Me levantei em meio à escuridão de meu quarto, entrei embaixo de minha cama, dentro de meu armário. Sentia uma sensação terrível de que algo poderia me puxar, me cortar. Mas enfrentei, me acostumei noite após noite a ficar dentro da escuridão gelada que a maioria dos outros meninos não tem coragem de ficar.

Até que escuridão começou a falar comigo.

É mais ou menos como dizem. A escuridão fala, se você abrir os ouvidos para ouvir. Começou com um sussurro, tive medo, mas não fugi. E a voz se tornou cada vez mais alta.

Promessas de poderes, promessas de sorte e fortuna. Eu ouvi tudo isso, mas nunca havia aceitado. Ela não tem nome. Escuro, Treva, Bicho-Papão, Diabo. Seu nome não importa. Pois ele é o medo, e ele espreita faminto no escuro. E eu não tive medo dele, pois descobri que era parte dele. Ele conversava comigo, pois minha natureza era maligna como a dele.

Não deviam ter gritado comigo essa noite.

Não deviam ter me posto de castigo e me chamado de filho do diabo.

Eu cedi. Trancado no meu quarto desliguei as luzes e dei um grito silencioso para a escuridão me ouvir. Eles mereciam, eu tinha a oportunidade, e não pensei duas vezes em usar.

A escuridão não tem nome, não tem limites, e eu pedi para que ela usasse seu pior. Uma fera, um demônio, algo com dentes, presas e sede de sangue.

Sabia que tinha funcionado quando ouvi o barulho dele pesado, batendo no primeiro andar abaixo dos meus pés.

Primeiro meu pai. Ele estava sentado no sofá, não notou a escuridão se movendo atrás dele. Eu não podia ver, mais podia sentir. Os dentes grossos como espadas fincando em sua cabeça. O sangue espirraria quente no assoalho de madeira. Sua mão trêmula deixaria cair o jornal em um último espasmo.

Minha mãe na cozinha. Ainda teve tempo de ver a criatura se arrastando pelo corredor, mas antes que pudesse gritar suas garras rasgaram sua garganta. Foi devorada no chão. O copo do liquidificador derramou o suco que ela estava fazendo, misturando-o com o sangue.

Suas patas pesadas subiram lentamente as escadas.

A inútil da minha irmã mais velha estava trocando de roupa com os fones no ouvido. Não o ouviu entrar pela porta. Ela não conseguiu gritar. Ela o viu, mas não acreditou que aquilo estava acontecendo. Foi seu último erro, Suas garras rasgaram seu abdômen nu. Ele mordeu seu rosto e sentiu o sangue borbulhar e espirrar em sua garganta. O walkman dela rachado, travou na música que estava tocando, fazendo o loop da música ser o som de fundo da sua morte.

Já faz um bom tempo agora, ele está de frente para o meu quarto. Vai destruir minha porta a qualquer momento. Eu mereço. Por tudo que fiz ele fazer à minha família. Me pergunto como eu morrerei. Adeus Vermes, adeus mundo idiota e suas regras estúpidas.”

Essa mensagem foi encontrada no quarto de Scott Ridley. A família Ridley não foi encontrada, nem seu filho mais novo, Scott. Esse caso foi marcado como “Sem explicação” pela perícia local, pois não havia marcas de arrombamento na casa, nem de seqüestro ou furto. A família simplesmente havia desaparecido. Todos que leram a mensagem deixada por Ridley não conseguiram deixar de ficar perturbados. Não havia sangue em nenhum dos cômodos, nem nenhum objeto havia sido roubado.

Apenas um jornal no chão da sala, um copo de liquidificador na cozinha, um walkman no quarto da irmã da irmã mais velha. E essa carta no chão do quarto de Scott.

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